Escritor Leandro Machado lança livro "Kaapora", um romance ambientado na Ilha do Marajó
- blognewschristian
- 1 de jun.
- 5 min de leitura
Natural de Breves, na Ilha do Marajó, o escritor Leandro Machado, lançou o livro Kaapora. O romance que ganhou elogios de Edyr Augusto é ambientado na Ilha do Marajó, no Pará.

SOBRE A OBRA
Segundo o Dicionário Houaiss, "caipora" ou "caapora" (do tupi kaa'pora) é uma entidade
fantástica associada às matas e florestas e aos animais de caça, dela se dizendo que
aterroriza as pessoas e é capaz de trazer má sorte e mesmo causar a morte.
O romance Kaapora narra a saga de uma família ribeirinha do Marajó, imersa num
turbilhão de violência que se esconde no interior da quietude tropical. Uma teia de
circunstâncias extremas vai unir as histórias de Izomar, Valdeci, Vânia, Josefa e Carvalho,
revelando uma série de mazelas envolvendo sangue, abuso, política e indiferença no seio
da Amazônia Marajoara.
Uma narrativa vigorosa e impactante, uma grande estreia de um jovem autor paraense.

Apresentação
Escrever literatura no Marajó é uma aventura, digo mais, um ato de coragem, no entanto,
necessário, pois a literatura se apresenta como algo crucial e decisivo na vida das pessoas.
A literatura, como afirma Antonio Candido, é mais uma de nossas “necessidades básicas e
universais”, é “uma realidade tão política e humanitária quanto a dos direitos humanos”.
Foi nessa proposição que aceitei o desafio de me deixar humanizar pela escrita pulsante
de Leandro Gonçalves, jovem professor de literatura que tive a oportunidade de conhecer
ainda no curso de letras da Universidade Federal do Pará, Campus do Marajó-Breves.
Desde o início, Leandro Gonçalves me surpreendeu com o seu amplo repertório de
leitura, diga-se de passagem, o seu gosto pelo gênero fantástico, destacando-se entre os
alunos da turma com um dos melhores trabalhos de conclusão de curso, que tive a honra
de compor a banca examinadora em 2022, cujo tema é igualmente peculiar – Literatura e
cinema: um estudo sobre o fantástico em O Exorcista, de William Friedkin.
Assim, após cumprirem as suas metas, alguns alunos e alunas percorrem caminhos
vários, o de Leandro foi decisivo: escolher a literatura como ofício para se lançar na cena
literária do Arquipélago do Marajó, especialmente em Breves, uma quase metrópole
ribeirinha na Amazônia. Nesse cenário, a literatura encontra um terreno fértil e
promissor com a recente criação da Academia Brevense de Letras (ABL), momento
histórico em que a cidade de Breves passa por grandes transformações no âmbito de sua
fisionomia urbana, e assiste uma Nova Breves nascer num ritmo frenético.
Nesse contexto, a ficção de Leandro Gonçalves desponta com o seu Kaapora. Talvez,
como resquícios de uma memória ancestral das matas que sobrevive em meio as
transformações urbanas, ou um ancestral sempre a espreitar o homem amazônico em sua
constituição originária e mítica. A propósito, o título do livro faz jus ao “Marajó das
florestas”, termo cunhado pelo pesquisador marajoara, Agenor Sarraf. Na língua
originária, “Kaapora” é uma mata bonita, Ka’a porã, associado aos povos originários das
matas, difundido na mitologia indígena como a figura do Caipora. A entidade pertence ao
imaginário das matas, juntamente com outros seres, daí a associação, muitas vezes,
estereotipada do caipira, que está à margem do universo urbano; daí a associação dos
termos caipira e caipora.
Justamente tudo isso num momento crucial de viradas de paradigmas e de uma nova
consciência ambiental e insurgente; de um “futuro ancestral”, como adverte Ailton
Krenak, e que nos convida a repensar os nossos modos de viver. O Kaapora/Caipora
enquanto síntese e elemento de mesclas foge aos padrões normativos e eurocêntricos,
pois nos convida a refletir sobre o centro de outras margens, ou a margem de outros
centros, virada de paradigmas, novamente, que é sair de um lugar comum e confortante,
para enxergar uma nova realidade. Ficcionalmente, este Kaapora que nos chega é um
chamado íntimo sobre a mazela e a precariedade de vidas de homens, mulheres e crianças
que vivem no Marajó, nos rios e furos de difícil acesso, até mesmo por navegadores mais
experientes dos furos e dos rios.
Em Kaapora, a paisagem e o espaço marajoara predominam, mas transcendem os limites
geográficos, já que alguns personagens avançam e se deslocam até os limites do
transnacional (Caiena e Suriname). Nesse espaço, o tráfico de combustível e de pessoas
também movimentam a economia da região; crimes e prostituição de mulheres são
denunciados, em alguns casos, a vulnerabilidade social, a violência, a crueza, a pobreza, e
a precariedade da infância e da exploração infantil, que são flagrados pelas lentes precisas
do autor brevense. Nem mesmo a utopia do garimpo e a “corrida do ouro” deixam de ser
sondadas. A vida extrema nesse espaço não escapa do olhar atento do narrador, ao passo
que a denúncia dos desmandos do poderio político no Marajó assume a veia central dos
conflitos do romance.
Além disso, o universo das navegações é descrito de maneira realista, beirando um olhar
cinematográfico. Por aí transitam os vendedores de açaí, palmito e frutos da região, que
favorecem as transações de mercadorias dentro das navegações; algumas transações
ilícitas, como, por exemplo, a disputa de óleo diesel, que também serve de moeda de troca
para angariar votos e eleger uma grande massa de políticos da região. Não por acaso, o
estilo do livro se aproxima dos traços literários de Edyr Augusto, escritor paraense, e há
um diálogo intertextual em muitas passagens, que nos remete à trama de dois livros
basilares desse último autor, Casa de Caba e Pssica.
As personagens de Kaapora, alguns mais notabilizados por seus vulgos (Valdeci/Catita,
Izomar/Diabo do Rio, Mucuim, entre outros); e as mulheres (Josefa e Vania) vivem
situações extremas: a mãe por ter de arcar com a solidão e a criação dos filhos entregue a
um trágico destino, e uma vida de extrema fome e pobreza nos rios do Marajó, depois da
morte de Izomar: “A vida é seca no rio Jacarezinho”, escreve o narrador. E a menina
Vania que ainda menor é levada ao trabalho infantil dentro das embarcações, juntamente
com o seu irmão mais velho, culminando no rapto de Vania por parte de uma rede
clandestina de exploração sexual no Marajó.
Nesse universo, o mitologismo amazônico é sutil e alguns mitos se entremeiam aos
discursos, alguns falares e variantes linguísticas típicas das personagens, como na
passagem: “[...] quando os filhos dos comparsas apareciam, sempre pensava ser um deles,
bastardo do marido. Filho de boto”, “Ela que sempre esteve ali, como uma boiuna
espreitando a comida na água baixa”.
Que os leitores não esperem por redenção ao final do livro, pois não há. As personagens
cumprem as suas funções e seus destinos fatais; alguns são ceifados em decorrência da
vida de violência e crimes que cometeram; outros não contam com um destino preciso, e
o leitor pode supor, nessa abertura livre de fruição do texto ficcional predomina uma
sensação de desassossego e abjeção diante do efeito impactante do livro Kaapora.
Se para Antonio Candido, a literatura tem essa capacidade de libertar o leitor do caos e
humanizá-lo, sem sombra de dúvida, o Kaapora cumpre essa função.
Danieli dos Santos Pimentel, UFPA-Breves
SOBRE O AUTOR: Leandro Machado é um autor marajoara da cidade de Breves, no Pará. É formado em Letras pela UFPA – CAMPUS MARAJÓ. Possui trabalhos literários publicados em revistas da USP, UFPA, UFRN, além de participações em antologias. Suas influências de escrita
perpassam por diversos signos, como filosofia, cinema, heavy metal e literatura paraense.
Ficha técnica do livro:
Título: Kaapora
Autor: Leandro Machado
Gênero: Romance
Capa: Marcelo Nunes
Foto da capa: Bruno Walter Caporrino
Ano de publicação: 2024
Edição: 1a
Dimensões: 14 x 21 cm
Acabamento: brochura
Número de páginas: 112
ISBN: 978-65-83074-11-9
Preço de capa: R$ 50,00


















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